quarta-feira, agosto 3

Entrou-me pela televisão

Ontem, a liberdade entrou-me pela televisão. Era assim:

Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada,
estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa.

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca.

Liberdade, Fernando Pessoa

12 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Dobrada à moda do Porto

Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,
Serviram-me o amor como dobrada fria.
Disse delicadamente ao missionário da cozinha
Que a preferia quente,
Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria.
Impacientaram-se comigo.
Nunca se pode ter razão, nem num restaurante.
Não comi, não pedi outra coisa, paguei a conta,
E vim passear para toda a rua.

Quem sabe o que isto quer dizer?
Eu não sei, e foi comigo ...

(Sei muito bem que na infância de toda a gente houve um jardim,
Particular ou público, ou do vizinho.
Sei muito bem que brincarmos era o dono dele.
E que a tristeza é de hoje).

Sei isso muitas vezes,
Mas, se eu pedi amor, por que é que me trouxeram
Dobrada à moda do Porto fria?
Não é prato que se possa comer frio,
Mas trouxeram-mo frio.
Não me queixei, mas estava frio,
Nunca se pode comer frio,
mas veio frio.

Álvaro de Campos

3/8/05 3:35 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Obrigada! :-)

3/8/05 3:42 da tarde  
Blogger paulo said...

Eu acho que as criancinhas deviam ser abolidas

3/8/05 3:50 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

QUEM A TEM...

Não hei-de morrer sem saber
Qual a cor da liberdade.
Eu não posso senão ser
desta terra em que nasci.
Embora ao mundo pertença
e sempre a verdade vença,
qual será ser livre aqui,
não hei-de morrer sem saber.

Trocaram tudo em maldade,
é quase um crime viver.
Mas embora escondam tudo
e me queiram cego e mudo
não hei-de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.


Jorge de Sena

3/8/05 3:52 da tarde  
Blogger maria said...

se até quando
"A formiga no carreiro
Vinha em sentido contrário..." (ainda que caindo) sabe cantar alto
"Mudem de rumo"
então pela nossa acção,
liberdade pode ser, (hoje pode ser!) ter
O livro na mão porque se escolhe que
É Esse que se quer ler...

e os seus/nossos autores, como O de partida, seguido por mais um pouco de si ou um amigo com "sinais de fogo" o que, neste país em pleno Verão escaldante, nos pode levar de visita às "antigas e novas andanças do demónio"...

(isto foi já o grilo-falante instalado no meu ombro a mandar-me de volta aos papéis...)
:)

Ai que prazer
não cumprir um dever...

e eu por aí iria, tão bem...

3/8/05 4:33 da tarde  
Blogger Cadelinha Lésse said...

As crinacinhas deviam ser abolidas? Que barbaridade!
Ao resto do pessoal: vá, não me estraguem com mimos

:)

3/8/05 4:43 da tarde  
Blogger paulo said...

Aboli-las no bom sentido: torná-las mais raras e portanto mais apetecivéis.

4/8/05 3:34 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Por mim, bem podem andar por aí à vontade. Não são minhas...

4/8/05 5:50 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Deixai vir a mim as criancinhas!

Doido

4/8/05 6:26 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Pronto, temos Doido pedófilo...

4/8/05 7:03 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Não! Filo(et) só mignon.
E entre sobrinhos, filhos, enteados e alunitos são mais de 100.

É muita alma e coração!

PS: Vivam as crianças de 40.

5/8/05 3:45 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Ora bem!
E viva o pó-de-arroz,
o leite condensado,
a couve-flor e o ar condicionado...
bendito seja ele,
nestes dias infernais,
que nos acalma os ânimos,
em calorosos vendavais
Prontos

5/8/05 4:36 da tarde  

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