Menino Jesus - Parte II
(...) O menino, que já estava a entrar na puberdade e não conseguia sair da desconfiança de ser filho de pai incógnito - cruzes, como é que o miúdo havia de ser feliz? -, empreendeu um plano para descobrir quem era e onde estava o tal José. Resolveu escrever a Deus. Foi à papelaria da esquina e arranjou um bloco de folhas A4. De borla, em troca dos favores adiantados ao dono da loja, a quem lavava o carro todos os quinze dias.
À luz de uma pequena lanterna de mineiro, para não incomodar a mãe, que dormia no mesmo quarto (os outros dois rapazes partilhavam um sofá-cama na sala e assim estavam mais à vontade para se deixar entumescer com as revistas da playboy que roubavam na escola e que viam à vez cada um), o menino pegou no papel e numa caneta e começou a escrever a carta.
“Querido Deus... não, assim não. Estimado Deus... também não está bem. Ó meu! (melhorzinho), eu sou o menino que tu criaste, lembras-te? Escrevo-te para desfazer uma dúvida. Ando muito triste, pois, como se não bastasse os outros meninos chamarem-me lagartixa e gozarem com a minha roupa, eu não sei quem é o meu pai. Ou melhor, a professora de história, a D. Carminda (que raio de nome e com ela os outros não gozam), diz que ele se chama José e que conheceu a minha mãe numa festa de garagem. Mas depois parece que se baldou mal soube da gravidez (os meus irmãos são só meios-irmãos e também não conhecem o pai, raios partam esta família) e foi trabalhar para o estrangeiro. Da última vez que deu notícias, parece que trabalhava numa carpintaria, mas não sei onde. Tu, ó Deus, que és omnipresente (parece que isto quer dizer que estás em todo o lado), será que consegues espreitar para todas as terras do mundo à procura do meu pai? Caramba. Vou fazer 14 anos e nunca tive um presente de jeito no Natal, que ainda por cima coincide com o dia do meu aniversário, ou seja, tenho direito a duas prendas.
(...)
À luz de uma pequena lanterna de mineiro, para não incomodar a mãe, que dormia no mesmo quarto (os outros dois rapazes partilhavam um sofá-cama na sala e assim estavam mais à vontade para se deixar entumescer com as revistas da playboy que roubavam na escola e que viam à vez cada um), o menino pegou no papel e numa caneta e começou a escrever a carta.
“Querido Deus... não, assim não. Estimado Deus... também não está bem. Ó meu! (melhorzinho), eu sou o menino que tu criaste, lembras-te? Escrevo-te para desfazer uma dúvida. Ando muito triste, pois, como se não bastasse os outros meninos chamarem-me lagartixa e gozarem com a minha roupa, eu não sei quem é o meu pai. Ou melhor, a professora de história, a D. Carminda (que raio de nome e com ela os outros não gozam), diz que ele se chama José e que conheceu a minha mãe numa festa de garagem. Mas depois parece que se baldou mal soube da gravidez (os meus irmãos são só meios-irmãos e também não conhecem o pai, raios partam esta família) e foi trabalhar para o estrangeiro. Da última vez que deu notícias, parece que trabalhava numa carpintaria, mas não sei onde. Tu, ó Deus, que és omnipresente (parece que isto quer dizer que estás em todo o lado), será que consegues espreitar para todas as terras do mundo à procura do meu pai? Caramba. Vou fazer 14 anos e nunca tive um presente de jeito no Natal, que ainda por cima coincide com o dia do meu aniversário, ou seja, tenho direito a duas prendas.
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